Uns vão contentes, outros tristes, alguns rotineiros (embora eu ache que rotina e domingo sejam incompatíveis) e ainda existem os que simplesmente vão, esperançosos ou ansiosos, não sei.
Talvez haja ali, com certeza há um que pelo menos, que tem uma história incrível, que merecesse ser contada e divulgada ao mundo, mas essa tal história pode estar entrucada e esquecida num coração ou no sótão do cérebro.
Talvez aquela senhora séria, que eu poderia classificar como rabugenta, talvez essa senhora seja a mais velha de dez irmãos, numa das famílias grandes do Brás. Talvez ela tenha cometido um ato heróico, como salvar os irmãos de um incêndio, quando tinha apenas catorze anos. E talvez ela nunca conseguiu cozinhar bem por ter medo do fogo. Quem sabe?
Pode ser que nada disso tenha acontecido e a cara emburrada fosse só porque ela vai encontrar a nora e não gosta disso. Eu preferia acreditar que ela tenha sido heroína, assim, pelo menos, a vida valeria a pena.
E essa pequena com o punho quebrado? Ela é vaidosa, mesmo com o gesso usa anéis e sorri, como se o adereço fosse uma luva de princesa em dia de baile. Ela tem tanto pela frente, é a primeira coisa que se pensa quando vemos alguém com menos de meio metro de perna. O que será que a aguarda? Uma infância comum ou uma adolescência precoce? Eu torço para que ela seja feliz, mas não se pode não temer. Meu quê determinista grita e eu vou ignorá-lo, enquanto desejo boa sorte pra menininha.
Olhe o salto da garota! É tão alto e a orna tão bem, mas é domingo antes do meio dia, não deveria poder usar saltos que humilhassem meu chinelo. Ela se foi e eu nem imaginei pra onde...
Todos se vão, sempre se vão. Ficamos a menina do canto e eu. Ela também espera alguém, pacientemente. Seu olhar está perdido, talvez ela esteja idealizando seu domingo. Talvez ela não esteja tão paciente, está ligando para alguém e morde os lábios de pura ansiedade. Mas, se eu não estivesse aqui há bons minutos, consideraria-a calma.
O bebe japonês gruda-se na janela e olha para mim – alguém me viu. Ele daqui uns anos vai estar surtando para cursar algo com nanotecnologia, mas agora está pegando vermes e bactérias (criando anticorpos?), enquanto cola a boca na janela.
Somos só nós duas de novo, nossas companhias não chegam, mas não vamos embora, não ainda. Ela tenta ignorar o mundo e eu tento senti-lo, obviamente falhamos as duas, são tarefas sem chances de sucesso.
A companhia dela chegou. Eles arrumam as bolsas e já se vão. Formam um bonito casal. E eu fico aqui, ainda. Gosto de pensar na vida dos outros, é menos atrapalhado que pensar na mina, mas acho que me vou também.
Tem sol e um parque bonito lá fora, vou tentar não pensar em nada enquanto espero. Ou pensar em Fernando Pessoa e ver se consigo imitá-lo e viver outras vidas, ao invés de só supô-las.
L. Puglia escreveu isso na Estação da Luz, enquanto esperava a amiga pra irem na exposição do Fernando Pessoa, que, aliás, estava lindíssima.